sábado, 1 de maio de 2010

VIVER:
O PIOR DOS TRABALHOS...


“São aqueles com quem vivemos e que amamos
que sabem como nos enganar...”.

Norman Maclean (1902 - 1990), escritor norte-americano



Tudo o que se faz obrigado, inclusive feriar, não é legítimo e, portanto, não merece consideração. O que dizer votar só porque se é obrigado? Mas, bom... Hoje, parece, é o Dia Mundial do Trabalho, que, dizem, foi instituído em 1889, durante um congresso socialista realizado em Paris – tinha de ser! Dizem, também – não quero nem saber a autoria da frase –, que o trabalho dignifica o homem, embora uma outra criatura tenha dito que é o homem quem dignifica o trabalho. Quanta perda de tempo! Afinal, não dizem, igualmente, que a ordem dos fatores não altera o produto? Mas, para não ficar parecendo que eu não estou nem aí para tão honrosa data - como se eu me importasse com isso -, dedico esta homenagem, digamos assim, a um trabalhador de extrema sensibilidade e profissionalismo, que é o ortopedista que, outro dia, me atendeu, porque consultar que é bom, nada! E só não digo o nome do santo porque, ao contrário dele e da minha ironia habitual, tenho o péssimo hábito de ser ética.

O fato é que, no início de abril, após dias e noites a escrever, quase devorando o teclado do meu computador, senti uma dor assombrosa no braço esquerdo, estendendo-se ao peito, tudo indicando, pelo menos para mim, que certos músculos estavam gritando. Como tenho Lesão por esforço repetitivo - LER nos dois braços, já tendo o problema, inclusive, atingido ambas as omoplatas, devido o uso indiscriminado do computador – antes era o da máquina de escrever, manual, e, antes desta, o das próprias mãos –, ao longo de mais de trinta anos, achei que era uma crise aguda decorrente da lesão e solicitei a um ortopedista, não o do qual pretendo falar, mas outro, um relaxante muscular alopata – coisa que só faço no extremo dos extremos, porque sou homeopatizada desde criança e, para mim, a homeopatia é a solução para todos os nossos problemas. Que o diga o meu estimado Hahnemann (1755 - 1843), o seu fundador e por quem nutro verdadeira consideração.

Ocorre que, durante o período em que tomei o medicamento alopata, que faço questão de dizer o nome, ou seja, Sirdalud, à base de cloridrato de tizanidina, 2 mg, com posologia recomendada de oito em oito horas, fabricado pela empresa Novartis e vendido só sob precrição médica, algo extremamente estranho, fora da aparente normalidade, aconteceu comigo. Além do distúrbio em meu sono, da sonolência e sabe-se lá mais o quê que deve ter me passado despercebido, atribuídos aos efeitos colaterais da droga, o meu braço, o mesmo que, dolorido, me fez pedir ao ortopedista um remédio para dor, desatou a manifestar incongruências, mas, sobretudo, na mão e nos dedos. Inicialmente, nem dei atenção, relevei, porque o incômodo, se é que posso chamar falta de sensibilidade no dedo mindinho esquerdo de incômodo, não me incomodava em nada, apenas estava lá, em nada me impedindo de escrever. Só que, para engano meu, a tal da falta de sensibilidade no mindinho foi, simplesmente, apenas o primeiro dos sintomas de algo que, depois, revelou ser mais complexo.

Assim, achando que era só mais uma crise de LER, fui levando. Dias se passaram e, de repente, na cozinha, ao cortar alguns legumes, dei-me conta de que estava sem a força habitual no braço, deixando derrapar uma cebola, uma batata, um chuchu... Para piorar, nesse mesmo dia, lá por volta da meia-noite – nem lembro mais o movimento que fiz diante do computador –, percebi o enrijecimento do meu dedo anular esquerdo. Como sou formada em jornalismo e – digamos – aprendiz de escritora, não tendo o maldito dom de escrever, que, aliás, nos leva a tecer escritos até então impensados, inclusive este post, para falar de um infeliz, impossível chegar, de imediato, a um diagnóstico. Desse modo, nem pensei duas vezes: corri para o hospital, em busca de um neurologista, acreditando que poderia estar desenvolvendo um Acidente vascular cerebral - AVC. Não, não pensem que sou hipocondríaca. Acho, apenas, que cada um tem a sua devida função nesta uma das faces da terra.

Ou melhor, do universo. Daí nunca me atrever a falar ou versar sobre algo que não tenho conhecimentos para tal. E, se procuro um especialista é porque – convenhamos –, como o nome já o diz, a criatura é um especialista, não importa a sua área de atuação. Além disso, por ser adepta da homeopatia, sou, portanto, um ser humano consciente e saudável, com imunidade de sobra, anualmente fazendo as mais diversas prevenções exatamente para não adquirir doenças, ou melhor, indigestos contras-tempo, defendendo a tese de que para todo problema existe uma causa. E é exatamente na causa que devemos buscar a solução para um dado problema. Bom... O neurologista que me consultou, após uma série de exames, deixou-me tranqüilizada, esclarecendo-me que a sintomatologia que eu apresentava não era a de nenhum tipo de AVC, mas que eu procurasse meu neurologista e fizesse um determinado exame.

Foi o que fiz e, dias depois, já de posse do resultado do tal exame, tentei marcar uma consulta com o ortopedista que o meu neurologista me indicou – o dito cujo de quem quero falar, especialista em pé, a quem, inclusive, eu deveria aproveitar a oportunidade e mostrar o meu tornozelo direito, que, ainda no carnaval, quando eu estava fazendo uma fotografia, teve, em função de uma pisada em falso, um rompimento em um dos seus ligamentos. Então... Após mais de três semanas tentando marcar uma consulta, inclusive implorando junto as atendentes/telefonistas, para, se possível, ser encaixada entre uma consulta e outra, já que – parece – ele é muito solicitado, eis que, finalmente, o homem resolve me atender. Ou melhor, me encaixar. Assim, encaixada, eis que, depois de esperar um tempo sem fim na sala de espera para ser atendida, apesar de ser hora marcada, uma porta abre-se, diante de mim, e, ao invés do médico, a primeira coisa que me chama a atenção, são diplomas.

Sim, os meus olhos, possivelmente refletindo certa perplexidade, se depararam com diplomas de não sei o quê pendurados em uma das paredes do consultório. Já achei estranho... Afinal, além de careta, não se usa mais esse tipo de artifício para alguém se afirmar, atestando que é bom nisso ou naquilo. Em minha opinião e acho que na da maioria das pessoas, é muita pretensão ou ignorância alguém, em pleno séc. XXI, achar que um diploma, ainda mais pendurado em uma parede, aos olhos de todos, seja comprovante de capacidade para alguma coisa. Esse cara, sem sombras de dúvidas, ou é narcisista ou teve um pai tirano, que, a todo custo, exigiu, ou melhor, cobrou do infeliz um diploma. No caso, o diploma de médico ortopedista e, aparentemente, especialista de pé. Digo aparentemente porque – tirando o problema do braço –, em menos de cinco minutos de atendimento, sem nem analisar o inchaço do meu tornozelo, ele já foi imprimindo uma receita de medicamentos para ambos, braço e pé.

Até então, ele só tinha lido o laudo do exame feito na clínica do meu neuro para o problema relacionado ao braço. Só que... E o meu tornozelo? Segundo o suposto mago, os medicamentos serviam para os dois problemas. Obviamente que pensei: “Esse cara é doido!”. E questionei. Na medida do possível. Infelizmente, pura perda de tempo. O meu. Porém, o pior viria depois. Após ter lido o tal laudo, o infeliz disse que o problema do meu braço era, simplesmente, uma tal de Síndrome do túnel cubital. E pronto! Assim, interrompendo a sua eloqüência, perguntei quais seriam as causas para um problema dessa natureza. Para minha surpresa – outra –, o douto disse não saber, comparando a sua função a de um engenheiro, dando, inclusive, um exemplo para isso. Ou seja: quebra-se um cano, troca-se o cano. Retruquei, querendo saber se, na condição de especialista, como ele, antes de trocar o cano, supostamente representando um braço, não ia atrás das causas que fizeram o cano ser trocado?

Só que, aumentando ainda a minha perplexidade, o infeliz respondeu que, para ele, as causas da corrosão, digamos, do cano, no caso do braço, não passavam de mero detalhe. Ora, dizer isso para uma pessoa que acredita piamente na homeopatia, que, aliás, concentra-se, sobretudo, nas causas e não no problema, é como se você dissesse para um padre pedófilo – já que também estamos falando de pé – que ele não poderia mais ser confessor de uma criança. É demais, como se eu fosse idiota para não perceber o seu charlatanismo! E isso porque o meu plano de saúde pagou o atendimento. Imaginem se eu tivesse pago em espécie! Aí, seria duplamente idiota. Só que, para completar, achando pouco todas as asneiras que disse, o jovem anotou em um papel o nome de outro suposto especialista, só que em mãos, a fim de eu procurá-lo, sugerindo, ou induzindo, para o meu caso, uma cirurgia. Não satisfeita, insisti em querer saber as causas que poderiam ter motivado o problema.

O médico? Levantando-se com um monte de papel em mãos, incluindo uma receita grampeada a uma propaganda de uma farmácia de manipulação - observei todos os seus passos -, já praticamente obrigando-me a aviar os medicamentos nela, dirigiu-se à porta. Eu? Sentada estava, sentada fiquei. E disse que não sairia enquanto ele não analisasse o meu pé, a sua especialidade. Assim, tirei a sandália, arregacei a calça e coloquei o meu pé em cima de uma cadeira, fazendo-o, a contragosto, ver o meu tornozelo. Pensam que mudou alguma coisa? Rien de tout! E fui obrigada a resignar-me, dirigindo-me à porta que ele me abria. Só que, antes de cruzar a soleira, voltei-me e perguntei se ele tomava guaraná em pó, embora a minha vontade fosse a de perguntar se ele cheirava cocaína. Surpreso com a minha pergunta, ele disse que não, ficando parado, a me olhar, como se quisesse saber o motivo do questionamento. Odiando aquele nosso encontro, eu disse que o achava muito ligado, que ele fosse mais atento com os seus pacientes.

Óbvio que não preciso dizer a cara de indignação e ódio que o médico fez. Mas, não pensem que fiquei p da vida com ele não. Nunca! Só constatei um fato. Simples. Afinal, para isso, sou especialista, já que essa é a função do jornalista, ou seja, constatar fatos. E, em minha opinião, o médico em questão é uma fraude. Tanto que, apesar de ele ter dito que eu voltasse lá daqui a dois meses para ver o meu tornozelo, nem quero mais vê-lo. E vou denunciá-lo ao meu neuro, que o indicou, embora devesse era denunciá-lo ao conselho regional de medicina. Ah! Antes que eu esqueça... Não vou aviar os medicamentos, um via oral e outro tópico, na farmácia que o ortopedista sugeriu, já que tudo o que vier dele não chego nem perto. Com exceção do especialista em mãos, que ele me indicou, para outra avaliação do meu braço, que espero não ser também um picareta. Mas, diga-se de passagem, só vou para ter outra avaliação sobre o meu braço, mão e dedos.

Ah! Além disso, vou reportá-lo do atendimento do seu colega dito especialista em pé. O engraçado, contudo, é que esse episódio fez-me lembrar de um depoimento da minha querida Lygia Fagundes Telles, que, aliás, já tive a honra de entrevistar. Ela disse: “Eu acho a loucura extraordinária. Nós somos razoavelmente loucos, todos nós. Eu acho isso ótimo. (...) Eu fiz análise. Um dia eu fui num cara e tal, eu estava muito aflita e, quando eu percebi, ele tinha mais medo, estava mais aflito do que eu. Eu fui lá para falar sobre o meu problema e ele acabou chorando, porque a sua mulher estava com câncer. Uma história horrível. Então, eu saí de lá, paguei uma nota alta, fui para a rua e disse: 'Olha, eu tenho de me virar eu mesma, porque eu já entendi tudo. Eu tenho de me virar mesmo...'”. Ah! Quem quiser ler a entrevista na íntegra, que, inicialmente, foi publicada no extinto Pasquim 21, em abril de 2003, ela está em meu blog, mais precisamente no link:

http://abagagemdonavegante.blogspot.com/2009/07/do-bau_30.html

Enfim! Para finalizar, gostaria de dizer que, se o ortopedista não foi capaz de me dizer as possíveis causas do meu problema, muito menos de explicá-lo, embora, necessariamente, não seja preciso uma intervenção cirúrgica para solucioná-lo, ainda mais sendo um transtorno tão comum, segundo ele, pesquisei na internet a respeito e, graças a uma revista médica virtual, fiquei sabendo que a tal da síndrome do túnel cubital “é o resultado da compressão do nervo ulnar, um dos principais nervos da mão, quando ele passa pela parte interna do cotovelo. Esta compressão pode ocasionar dor na mão e no cotovelo, diminuição de força na mão, adormecimento ou sensação de formigamento nos dedos anular e mínimo”. O nervo ulnar, por sua vez, “em seu trajeto pelo membro superior, pode sofrer compressão em vários níveis, sendo o cotovelo o local mais freqüente. A síndrome do túnel cubital, como é denominada essa alteração, é a segunda neuropatia compressiva mais comum do membro superior”.





Infelizmente, continuo sem saber se foi ou não o relaxante muscular que provocou tal agonia, embora eu ache que sim, porque, um dos seus efeitos colaterais é um tal de Distúrbio músculo-esquelético. Olhem o nome! E quem me explicaria que diabo é isso, ou seja, as causas do meu problema? Acho até que fizeram macumba para mim. Sim porque meu inferno astral já passou. Ou será que, ao invés de mensal, porque, segundo dizem, tudo de ruim acontece no período do inferno astral, o maldito virou anual?


Nathalie Bernardo da Câmara


P.S .: Dedico este post a minha irmã Tereza, educadora, que insistiu para eu não deixar passar em branco data tão memorável, atrasando, inclusive, para escrevê-lo, outros posts em elaboração, cujos temas, para mim, são mais interessantes. Ah! Ela, a minha irmã, entrou, inclusive, para as estatísticas da área da saúde, por, outro dia, ter contraído dengue - coisa de Terceiro Mundo - e, sendo o primeiro caso em seu bairro, foi solicitada para ir a Secretaria de Saúde do município de Natal, onde ela mora, para fazer um exame, comprovando o problema e, para seu bel prazer, fazer parte das estatísticas. O fato é que, por causa disso, o bairro no qual ela mora receberá a visita, sempre necessária, de um carro fumacê – acho que se escreve assim –, a fim de “espantar” os mosquitos da dengue na região. E tenho dito!

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