quarta-feira, 1 de junho de 2011

AMOUR PORTANT DES FLEURS


Carracci, Annibale (1560 - 1609) – Museu Condé, Chantilly, França

“Provação significa que a vida está me provando. Mas provação significa também que estou provando. E provar pode se transformar numa sede cada vez mais insaciável...”.

 (1920 - 1977)
Escritora brasileira nascida na Ucrânia



Banzo mata aos poucos...


Outro dia, nas madrugadas, em meio a uma tempestade, uma barata entrou pela janela do meu quarto em um vôo para lá de rasante. Eu estava no computador, escrevendo, e tomei um susto, gritando, embora não de medo – e sem histeria –, pois a minha repulsa por baratas resume-se a nojo. Afinal, elas são fedidas demais – sinto o seu mau cheiro de longe! E não as suporto. Acho um ratinho até mais bonitinho e interessante... Lúdico. Enfim! Classificada como ortóptero onívoro, da ordem dos blatários – é muita complexidade! –, a barata, essa coisa que remonta à época dos dinossauros, igual à tartaruga e ao escorpião, pode ser silvestre – hoje, por modismo, chamada de ecológica – ou doméstica. E alimenta hábitos noturnos.

De imediato, me lembrei de Clarice Lispector, que, em seu romance A Paixão segundo G.H., publicado em 1964 e, segundo o crítico literário brasileiro José Castello, considerado por muitos o grande livro da autora, descreve a relação ficcional de uma escultora com uma barata. Simplesmente, algo nojento, pois, após se deparar com uma barata em um armário e esmagá-la com a porta do mesmo, a personagem come a gosma branca que é expelida do organismo da coisa, conseqüência do esmagamento, desestruturando, assim, a sua condição humana, embora, depois, resgate o seu equilíbrio emocional e a sua identidade. É escatológico! E mais repulsivo não poderia ser. Haja criatividade da autora!

Ocorre que, quando me lembro da passagem do livro, na qual a personagem come a tal da gosma branca que escorre da barata – quanto delírio! –, o esôfago grita e dá vontade de vomitar, já que tudo é muito desprezível, a própria náusea, sendo a narrativa, por suas características, notadamente existencialista – nem o filósofo e escritor francês Jean-Paul Sartre (1905 - 1980) delirou tanto! Sei não, mas, primitiva, a barata é asquerosa. Um acinte à estética, as nossas narinas e condição de humanos. Enfim! Como disse um amigo meu, músico gaúcho: “Baratas são como petistas: podem passar bilhões de anos que não mudam, não evoluem”. Nossa! Pegou pesado. Fiquemos, então, com Clarice, que disse ser a paixão o golpe da graça...


Nathalie Bernardo da Câmara


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