quarta-feira, 28 de março de 2012

CONCRETO NOSSO DE CADA DIA


“Outro dia, entrei no mato para piar um inhambu e o que saiu de trás da moita foi um Volkswagen...”.

Tom Jobim (1927 - 1994)
Compositor, cantor e instrumentista brasileiro


Não é de hoje que a verticalização cada vez mais frequente e desenfreada de Natal, capital do Rio Grande do Norte, chama a minha atenção, bem como a da maioria dos seus moradores, nascida ou não na cidade. Certa vez, contudo, no dia 21 de junho de 2011, publiquei a postagem intitulada Cidade do Sol (http://abagagemdonavegante.blogspot.com.br/2009/05/7-em-1-castrar-ou-nao-castrar-eis.html), na qual teci algumas considerações a respeito, ou seja, “o gritante aumento populacional” de Natal, o comprometimento preocupante da “população local, que, não faz muito tempo, ainda podia desfrutar da brisa benfazeja que, devido à localização estratégica do lugar, era, generosamente, ofertada pelo mar, que, aliás, nunca pediu nada em troca. Ao contrário! Sempre esteve a dar mais e mais...”. À ocasião, mencionei, inclusive, le coup de foudre, ou seja, o amor à primeira vista de muitos turistas por Natal. Afinal, não demora muito para que, mesmo de passagem, os turistas conheçam “a beleza das suas paisagens” naturais, “o calor humano dos nativos” e “a sua peculiar gastronomia”, logo caindo de amores pela chamada Cidade do Sol, findando por decidirem morar aqui – a gota a mais que sempre impulsiona especulações imobiliárias e alimenta a ambição da construção civil, que, aliás, já tendo explorado terrenos outrora desocupados, nos quais, inclusive, da noite para o dia, despontam edificações as mais diversas, de uns tempos para cá, tem investido na compra de novos espaços, digamos, alternativos – alternativos para a construção civil, né? Ou seja, a compra de um grande terreno habitado, cuja transação consiste numa troca: o terreno, com tudo o que nele tiver, por certa quantidade de apartamentos no edifício que será construído no local.

Ocorre que, profundamente ligados pelo afeto a casa na qual, por exemplo, moram há décadas, muitos não aceitam a oferta. Outros, contudo, apesar dos sentimentos que nutrem por aquela que lhe deu teto e histórias, boas ou não – não importa –, ao longo da vida, aceitam a proposta – foi o caso da minha mãe, que logo estará vendo a sua casa sendo derrubada para, em seu lugar, ser erguido um edifício sabe-se lá de quantos andares e que, sem dúvida alguma, comprometerá ainda mais com a poluição visual da cidade. Daí que, “diante de tantos obstáculos, a brisa do mar ou recua ou vai para outro lugar, não mais para a cidade. Quem perde com isso? Todos os que moram em Natal, que virou um forno abafado e quente, insuportavelmente inabitável, sobretudo para quem é avesso a calor. E com o efeito estufa, então! Isso sem falar na erosão inevitável das dunas...”. Segundo ainda a referida postagem, “o pior é que, com o crescimento populacional, aumenta o acúmulo de lixo e a quantidade de veículos circulando pelas ruas da cidade, que, desde os seus primórdios, foi privada de largas avenidas, o que agrava o fluxo de carros, tornando o trânsito estressante e sufocante, devido à emissão em demasia de gás carbônico na atmosfera. É poluição sonora, visual, do solo, do ar...”. A solução para o problema em questão? Confesso que desconheço, mas tenho curiosidade em saber se há alguém que a tenha. Se tiver – não se acanhe, como se diz no Nordeste –, me avise! Enquanto isso, eu aproveito o ensejo para parafrasear alguns dos versos da letra Águas de Março, de autoria daquele que, em vida, foi não somente um amante incondicional do seu lar, o Brasil, mas, também, tão criativo, ou seja, Tom Jobim: É cal, é ferro, é o fim do caminho, é um resto de casa, é o concreto no ninho...


Nathalie Bernardo da Câmara


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