sábado, 25 de maio de 2013

MADE IN AMAZÔNIA - MARINA SILVA: SABOR BRASILEIRO*

Foto: Bob Wolfenson/Vogue Brasil

“Marina é a síntese da diversidade cultural...”.

Mauro Almeida
Produtor musical brasileiro


Uma das nove filhas dos onze rebentos de um casal augusto, Pedro e Maria, retirantes nordestinos, Maria Osmarina Silva de Souza nasceu no dia 8 de fevereiro de 1958 numa antiga colocação (casas de seringueiros, geralmente construídas sobre palafitas, no caso, em terrenos arenosos), hoje chamada de Breu Velho, no seringal conhecido por Bagaço, a 70 km de Rio Branco, capital do Acre. A família, contudo, que labutava na árdua coleta do látex na imensidão da floresta, não conseguia pronunciar corretamente o nome Osmarina – falavam Ormarina – e, por sugestão de uma tia, passaram a chamá-la de Marina. Em 1967, essa mesma família deixou o seringal do Bagaço e, em busca de uma menos penosa vida, se transferiu para Manaus, onde abriu uma taberna, que não vingou, e seguiu para Santa Maria, no Pará, onde as condições de sobrevivência eram ainda piores. Em 1969, sem eira nem beira, como reza um dito popular, a família retornou ao seringal, no qual, com apenas dez anos de idade, Marina passou a trabalhar para ajudar no pagamento de uma dívida que os pais haviam contraído para poderem ter o direito nem que fosse a um ínfimo lugar ao sol – sol esse que, apesar das intempéries, acolhia, com generosidade, uma família de certa forma sui generis: um pai seringueiro, embora, nos finais de semana, aplicasse injeções nos que necessitavam de algum tipo de cura; uma mãe costureira, cosendo de tudo um pouco; uma avó parteira, que sequer pensava em medir os quilômetros que andava no mato para fazer todo tipo de parto, e um tio que, além de xamã, sempre às voltas com chás e ervas, era ferreiro, carpinteiro, cesteiro e mateiro, aqui e acolá achando alguém perdido na mata. Isso sem falar na própria Marina, cujos primeiros mestres foram a floresta e o seu povo, lhes transmitindo não somente a sua sabedoria, mas, também, a sua diversidade cultural, formando a inquieta acreana que, com o passar do tempo, sentia que o seu amor pelo meio ambiente só tendia a crescer, bem como a sua sensibilidade para traduzi-lo. Uma fatalidade, contudo, iria marcá-la: a morte da sua mãe por consequência da insalubridade infiltrada na região onde moravam quando ela tinha quatorze anos. Não demorou muito, aos quinze, duas das suas irmãs morreram: uma de sarampo e outra de malária, doença, inclusive, que, ao longo da vida, chegou a infectar Marina por cinco vezes, além de também ter tido leishmaniose e três hepatites, sendo, ainda, contaminada por metais pesados depositados nos rios amazônicos. O fato é que, em 1975, aos dezesseis anos, ela adoeceu seriamente e, com a permissão do pai, com uma muda de roupa e alguns trocados no bolso, deixou a floresta, o seu habitat, e foi cuidar da saúde em Rio Branco – cidade onde terminou por fixar residência e que se tornou um marco na sua trajetória. Contando, portanto, com a ajuda do então bispo do Acre, dom Moacyr Grechi, Marina foi acolhida num convento, onde passou a conviver com religiosas de uma dada ordem – convívio esse, aliás, que despertou na adolescente o desejo de se tornar freira. À época, entretanto, tudo indicava, havia um empecilho para que ela se dedicasse à vida religiosa. Segundo a própria Marina, a sua avó chegou-lhe a dizer: — Minha filha, freira não pode ser analfabeta.



Da melodia da floresta aos ruídos urbanos

“Vejo a minha trajetória até essa época como uma espécie de tessitura, aquela parte do cesto que vai definir tudo aquilo que o cesto vai ser depois. Ali consegui integrar as marcas da minha memória, baseada no saber narrativo que veio comigo do seringal as coisas que aprendi no contato com a cidade...”.

Marina Silva


Matriculando-se no Movimento Brasileiro de Alfabetização - Mobral, pois, como se diz até hoje, era analfabeta de pai e mãe, Marina Silva prosseguiu com os estudos e fez o Ensino Supletivo, concluindo o 2º grau em 1979, embora, durante esse tempo, para poder manter-se, trabalhasse como empregada doméstica. Nesse ínterim, aos 19 anos, ela se envolveu com o movimento dos seringueiros, conheceu e se tornou amiga do líder sindical e ativista ambiental brasileiro Chico Mendes (1944 - 1988), assassinado brutalmente cerca de 20 anos depois. Descobriu, ainda, a Teologia da Libertação, a arte da interpretação no teatro amador – período no qual teve o seu primeiro contato com grupos de esquerda. Influenciada, portanto, por movimentos sociais e políticos católicos da época, Marina passou a ter contato com obras de teor marxista-leninista. O Fato é que, seduzida de tal forma pelas letras e pelo saber em si, nunca abandonou os estudos, como o fez com o seu projeto de seguir a carreira de freira. Afinal, diante do leque diversificado de informações a seu dispor – o début, digamos, da sua futura globalização –, a sua trajetória já havia sido traçada, ou melhor, tecida. Decidida a estudar História – não fez Psicologia porque, à época, o curso inexistia no Acre –, era movida pela possibilidade, como ela mesma já o disse, de “lidar com muitas almas ao mesmo tempo, o coletivo delas adensado nos processos históricos”. Dito e feito. Em 1981, já casada e com uma filha, Marina deu início a sua graduação em História pela Universidade Federal do Acre (Ufac), se formando em 1984, aos vinte e seis anos. No primeiro ano de universidade, entretanto, estudava pela manhã, era voluntária da Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (Febem) a tarde e, à noite, costurava para fora, ajudando na renda familiar. No segundo ano de curso, contudo, passou a dar aula no colégio das freiras e em mais duas escolas, participando, inclusive, das Comunidades Eclesiais de Base (CEB). E tudo isso sem falar que ela ainda encontrava tempo para militar clandestinamente no Partido Revolucionário Comunista (PRC), já que a ditadura militar, embora decadente, continuava mandando no país, igualmente participando do movimento nacional que, em 1983, fundaria a Central Única dos Trabalhadores (CUT), enquanto, no Acre, a CUT só tenha sido fundada em 1984, sendo Chico Mendes o primeiro coordenador da entidade e Marina a vice-coordenadora – contribuição essa, aliás, que andava sempre lado a lado com o seu engajamento nas causas ambientais. Enfim! Com o diploma de historiadora nas mãos, Marina quis fazer mestrado em Teoria da História, mas, como teria de se transferir para São Paulo ou Rio de Janeiro, mudou de planos e optou por um mestrado em Economia, embora tenha cursado apenas um ano, o de 1985 – natural, pois ela estava para lá de envolvida com os movimentos sociais, dando aulas e, separada, cuidando dos seus já dois filhos. Muitas mudanças. Tantas que, em 1986, ela não somente voltou a se casar como também se filiou ao Partido dos Trabalhadores (PT), que havia sido fundado nacionalmente em 1980. Foi aí, então, que, nesse dado momento da sua vida, Marina, literalmente, deu início a sua carreira política.



A teoria e a práxis de mãos dadas

Foto: Divulgação

“Se o político não quer para si a doença degenerativa da ambição pelo poder em si, deve ser precavido, em benefício tanto da sua própria essência humana e do sentido maior da sua vida, quanto em nome da sociedade, por um imperativo ético...”.

Marina Silva


Poderíamos arriscar dizer que não somente a vida de Marina Silva como um todo, no sentido holístico da palavra, mas, especificamente, a sua trajetória política, sempre foram pautadas por uma idoneidade ímpar, embalada, por assim dizer, pelo aroma do seringal, impregnado que ficou nas suas raízes que, apesar de oriundas da floresta na qual nasceu e foi criada, se ramificou mundo afora. E tudo teve início quando, em 1986, filiada ao Partido dos Trabalhadores (PT), ela concorreu pelo Acre ao seu primeiro cargo público, que foi a uma vaga na Câmara dos Deputados. Infelizmente, apesar de Marina ficar entre os candidatos mais votados, o PT não atingiu o quociente eleitoral mínimo exigido. Porém, dois anos depois, ela foi eleita vereadora, a mais votada de Rio Branco, sendo uma das suas primeiras medidas a de devolver as gratificações, o auxílio-moradia e demais mordomias embolsadas sem questionamentos pelos outros vereadores. Não deu outra! O seu gesto gerou controvérsias: nos seus adversários políticos despertou a desconfiança; do povo, o reconhecimento – reconhecimento esse que, em 1990, se traduziu em votos e Marina foi eleita deputada estadual, obtendo votação recorde. Quatro anos mais tarde, com 36 anos, foi eleita, pelo Acre, a senadora mais jovem na História do Brasil. Em 1995, ao se transferir para Brasília para exercer o mandato, tentou realizar um antigo sonho: o de cursar Psicologia. O dia a dia corrido da senadora, entretanto, a impediu de concluir o curso, que frequentou apenas um semestre, abandonado, assim, aquela que poderia vir a ser a sua segunda graduação, passando, no caso, a se dedicar exclusivamente ao seu mandato de senadora. Em 1997, apesar de ter sido educada no catolicismo, se converteu ao cristianismo evangélico – detalhe esse da sua vida que, até hoje, gera polêmicas as mais diversas, sobretudo porque ela pertence as fileiras da Assembleia de Deus, cujo comando está nas mãos do controverso bispo Edir Macedo. Enfim! Em 2002, reconduzida ao Senado Federal, conquistou nas urnas uma quantidade de votos quase três vezes superior à anterior. Como se não bastasse, outra surpresa iria alegrar não somente o Acre em 2003, mas, também, o Brasil: além de tomar posse pela segunda vez consecutiva como senadora, Marina foi nomeada ministra do Meio Ambiente pelo então presidente Lula. Era inevitável, portanto, que por sua já reconhecida luta em prol da causa ambiental, ela continuasse a fazer a diferença. Tanto que, no Senado, foi quem primeiro ergueu a voz para que o governo federal assumisse metas para que o Brasil reduzisse as emissões de gases do efeito estufa – em 2009, o governo federal anunciou a adoção dessas metas. Entrementes, como sempre gostou de estudar, Marina não resistiu e, apesar de ministra, retornou à sala de aula. Um novo desafio, já que, em 2007, mesmo com todos os empecilhos que o cargo que ocupava lhe impunha, a disponibilidade de tempo para estudar, por exemplo – estudava muitas vezes em aviões ou nas madrugadas –, ela concluiu uma pós-graduação em Teoria Psicanalítica na Universidade de Brasília (UnB), já tendo antes, contudo, feito uma especialização em Psicopedagogia na Universidade Católica de Brasília (UCB). Soube administrar o tempo. Daí não ter se descuidado, durante a pós-graduação, sequer um momento das suas funções no governo federal. Tanto não se descuidou que, na condição de ministra, foi emblemática nas políticas ambientais que defendia e, quando não era boicotada, postas em práticas durante a sua gestão. Não obstante, devido os entraves com os quais constantemente se deparava dentro do próprio governo contra a sua política ambiental, Marina pediu demissão do cargo no dia 13 de maio de 2008, ou seja, há exatos 4 anos, retornando, assim, ao Senado, em cujo plenário, aliás, poderia expor e defender com liberdade as suas ideias e projetos voltados para o meio ambiente e a sua sustentabilidade – méritos esses, entre outros, que, em 2009, lhe valeu o internacional Prêmio Sophie (US$ 100.000), concedido pela fundação norueguesa homônima aos que se dedicam à causa da sustentabilidade do planeta – a coleção de prêmios, títulos, comendas e demais homenagens prestadas à Marina é de se perder de vista... Bom! Tecendo fios cada vez mais elaborados – a causa ambiental tornou-se para ela, digamos, uma profissão de fé –, Marina desligou-se do PT no dia 19 de agosto de 2009 e, onze dias depois, anunciou a sua filiação ao Partido Verde (PV) – os seus horizontes ampliavam-se cada vez mais. Ampliaram-se tanto que, no dia 16 de maio de 2010, ela lançou a sua pré-candidatura à Presidência da República, tendo, como vice, o empresário e ambientalista Guilherme Leal – não demorou muito, no dia 11 de junho, a candidatura de Marina foi lançada oficialmente, bem como também foi lançado, durante a sua campanha, o livro MarinaA Vida por uma causa, da jornalista brasileira Marília de Camargo César. O prefácio da biografia, por sua vez, é de autoria do cineasta brasileiro Fernando Meirelles, embora seja a cineasta brasileira Sandra Werneck quem recebeu a cessão de direitos da Editora Mundo Cristão para a adaptação do livro em filme, uma cinebiografia, que, inclusive, já tem título: Marina e o tempo. Com lançamento nacional previsto para janeiro de 2013, o longa-metragem, segundo informações divulgadas pela mídia, contempla um período de tempo iniciado na infância de Marina e concluído quando, já adulta – defensora histórica que sempre foi da preservação da natureza e da sua sustentabilidade –, ela passa a ser definitivamente reconhecida como uma referência internacional nas questões ambientais. Afinal, para Sandra Werneck, “a história de Marina Silva desafia os limites da ficção”. Só que o que aconteceu nas eleições de outubro de 2010 não teve nada de ficção. Surpreendendo a todos, Marina foi o terceiro candidato mais votado, conquistando, nas urnas, cerca de 20 milhões de votos válidos e, por tabela, o aumento da sua notoriedade. Segundo o jornalista brasileiro Gadelha Neto, da organização não governamental WWF, o Brasil já percebeu que, “dentro da aparentemente frágil compleição física de Marina Silva convivem uma cidadã da floresta, suave e ponderada, e uma guerreira, poderosa e aguerrida”, capaz de provocar efeitos os mais diversos onde quer que ela passe – fomos testemunhas disso nas últimas eleições presidenciais, não sendo à toa que, em junho de 2011, o jornalista, escritor e deputado Federal (PV-RJ) Alfredo Sirkis publicou o livro O Efeito MarinaBastidores da campanha que mudou o rumo das eleições, prefaciado, aliás, pela própria Marina, que considerou as eleições um complexo desafio. Interessante, contudo, é um depoimento do autor do livro, que disse: “Antes de entrar em qualquer diferenciação de natureza política, programática, mediática ou outra do nosso universo racional, o fenômeno Marina, como Gilberto Gil sacou de primeira, foi um acontecimento do coração”. Prova disso foi que uma considerável parcela do seu eleitorado deixou os preconceitos de lado e confiou o seu voto ao carisma inquestionável da ambientalista. Afinal, apesar de ser evangélica, como já foi dito anteriormente, ela já havia deixado bastante claro que, em momento algum da sua campanha iria fazer do púlpito um palanque nem do palanque um púlpito. E cumpriu com a palavra, ou seja, foi coerente – ganhou ponto. Já no que diz respeito a certos temas polêmicos que, não é de hoje, têm sacolejado não somente o Brasil, mas o mundo, tipo: legalização do aborto, descriminalização da maconha, casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, pesquisas de células-tronco de embriões, entre outras... Argumentando que, apesar de ser pessoalmente contra os temas mencionados, contou pontos a seu favor o fato de ter repetidamente dito que uma coisa é o que ela pensa e defende na sua vida privada; outra coisa é a postura que, na sua vida pública, ou seja, na condição de política, ela tem de assumir diante do que a sociedade almeja. Por isso que, em sua opinião, temas, de fato, polêmicos – alguns, inclusive, referentes a direitos fundamentais –, devem ser submetidos a plebiscitos nacionais, com o povo participando dos debates e decidindo o que quer para si. Assim, agindo novamente de forma coerente – afinal, vivemos no séc. XXI –, Marina mais uma vez ganhou pontos. Resultado: os seus predicados, inclusive o da credibilidade – qualidade em extinção no cenário político nacional –, venceram os preconceitos. Retomando, entretanto, ao depoimento de Sirkis, autor do livro O Efeito Marina..., o jornalista, escritor e deputado Federal, se referindo as eleições de 2010, acrescentou: “Foi uma das experiências mais ricas que já presenciei em 43 anos de vida política e, sem dúvida, uma das mais emocionantes”. Curiosamente, no dia 7 de julho de 2011, “a cidadã da floresta, suave e ponderada, e uma guerreira, poderosa e aguerrida”, como o jornalista Gadelha Neto definiu Marina, se desgarrou do PV – desde então, ela está, como poderíamos dizer... avulsa. E tão solta anda que, em uma entrevista, não hesitou em dizer que “a política não é monopólio dos partidos”. Enfim! Cotada como uma das possíveis candidatas para as eleições presidenciais de 2014, embora, para isso, ela necessite de um partido político, Marina limita-se a dizer: — Se, em 2014, com legitimidade, as circunstâncias da política do Brasil exigirem um passo nesta direção, eu peço a Deus coragem para dá-lo...



Do breu à luz

Foto: Bob Wolfenson/Vogue Brasil

“Marina é um passo à frente...”.

Wagner Moura
Ator brasileiro


E haja holofotes! Porém, como se trata de Marina Silva, não há brilho que se sobressaia à simplicidade do seu olhar, que ofusque a sua serenidade – estado de espírito esse, aliás, que, ao longo da sua jornada, por lhe ser peculiar, é da mais pura transparência, evidenciando, inclusive, o contraste entre a sua “aparentemente frágil compleição física”, como disse o jornalista Gadelha Neto, e a obstinação que, desde a sua mais tenra idade, tem guiado os seus passos. Isso sem falar que Marina não é de meias palavras, de rodeios, indo diretamente no âmago da questão. De raciocínio lépido e coerente, age, contudo, com bom senso e prudência, não sendo à toa que o seu nome é sinônimo de conquistas – triunfos esses que ela obtém com a sobriedade do seu caráter, mas, sobretudo, com ética, uma das suas mais valiosas qualidades. Enfim! Um ícone das florestas – nasceu e foi criada numa –, amálgama dos seus odores, frutos e flores, sons, cores e tons, Marina tornou-se, com o passar do tempo, praticamente um anjo da guarda do meio ambiente, do meu, do seu, do nosso. E, como costumo dizer: quero o meu ambiente por inteiro! Não pela metade... Desse modo, para quem pensar que, com esta postagem, estou dando uma, digamos, de cabo eleitoral de Marina ou, quem sabe, agindo como agem os utópicos, ou seja, romanticamente, na crença de que somente ela é quem poderá salvar o Brasil do caos no qual, infelizmente, está submerso, aparentemente sem comando e, portanto, sem rumo – tal qual, utopicamente, praticamente agiu toda uma nação, inclusive eu, quando, ainda na década de oitenta, acreditou piamente que Lula seria o salvador de uma pátria atolada no sangue derramado durante a longa e sombria passagem dos militares pelo poder no país, que foi de 1964 a 1985; ou, ainda, pensar que toda a postagem foi, de repente, encomendada, está para lá de equivocado. Na verdade, quando, de fato, resolvi escrever sobre Marina, embora já conhecesse boa parte da sua trajetória política – daí eu ter sido um dos 19.636.359 milhões dos votos válidos que ela recebeu nas urnas nas eleições de 2010 –, foi não somente para melhor me aprofundar no histórico de vida da mulher que brotou no seio da nossa mais bela floresta – e haja estirpe! –, cujo aroma eu realmente desejava sentir, mas, também, para render uma homenagem sincera e espontânea a um ser humano cuja idoneidade é, pelo menos para mim, hors de question. Afinal, como a própria Marina já disse, apesar de, no caso, se referir ao futuro da sustentabilidade do planeta: “Não haverá salvadores da pátria. Trata-se de um esforço conjunto, horizontal, cabendo a cada um as suas responsabilidades para o alcance de uma meta comum: a de salvar as condições objetivas que promovem a vida no planeta”. Voilà! E, assim, para finalizar a quarta e última parte desta postagem, falarei agora do leitmotiv que a desencadeou, ou seja, a leitura de algumas reportagens sobre a multifacetada Marina, sempre a nos abrir uma caixinha de surpresas, no caso, a sua porção designer. Sim, Marina também é uma artista – fato que, além de, até então, eu desconhecer – imagino que muitos igualmente o desconhecem –, vi com bons olhos. E literalmente, já que, apesar de, invariavelmente, admirar os acessórios – sobretudo os colares – que ela costuma portar nas suas aparições públicas, registradas, aliás, por atentos fotógrafos, eu não sabia é que é a própria Marina quem os idealiza e confecciona, ou seja, que os concebe – exemplo disso são as peças em destaque na primeira das imagens que ilustram esta postagem. Então! Uma das mencionadas reportagens foi a da revista Vogue italiana de outubro de 2010, cuja edição elogia os acessórios “étnicos” usados por Marina, que teria, segundo o periódico, criado um look alternativo no universo da moda, chegando, inclusive, a comparar a brasileira à pintora mexicana Frida Kahlo (1907 - 1954), considerada exótica por seu habitual visual, considerando que, no vestir de ambas, “há sempre um elemento tradicional”, ou seja, duas mulheres latino-americanas que aprenderam a se produzir sem deixar de lado as suas raízes. No caso de Marina, a jornalista italiana Alice Capiaghi diz que “os colares e os brincos que ela usa podem ser considerados uma reivindicação das suas origens humildes ligadas à Floresta Amazônica”, não sendo, portanto, as roupas que vestimos “apenas um mero acaso”. Tanto não é que, em 2011, na edição de julho da Vogue Brasil, ficamos sabendo que os tais acessórios usados por Marina, segundo a jornalista brasileira Giseli Miliozi, “são totalmente desenhados e feitos por ela, dos cortes aos polimentos”, sendo as matérias-primas originárias da Amazônia, tipo sementes de açaí, mulungu, licuri, jarina e haste de palmeira pupunha. É! As peças “fazem tanto sucesso que, finalmente, Marina resolveu entrar no mundo da moda e lançar a sua própria linha de bijuterias (de nome ainda mantido em segredo)”, embora duas coleções, “uma inspirada na tribo ashaninka e outra na dos navajos”, com 10 peças cada já estarem prontas: “Faço – diz Marina –, mas depois não quero vender” – que pena, pois eu faria de um tudo, como dizem os goianos, para adquirir nem que fosse um colar. O fato é: quem diria?! O que pode ter começado como uma mera terapia ou ocupação recreativa findou por se tornar um ofício. Mas, como disse Capiaghi: “Marina tem realmente o que podemos chamar de estilo e até mesmo uma elegância natural demonstrada por seu gestual e escolhas no vestir”. Eu, particularmente, definiria o que a jornalista chamou de “elegância natural” de suavidade. Enfim! Na edição de janeiro de 2011 da Vogue Brasil, ficamos sabendo que, presente a um desfile de moda de um estilista brasileiro, o mineiro Ronaldo Fraga, Marina prestigiou o evento portando um cusman, traje típico dos índios ashaninka, que habitam parte no Peru, parte no Acre. Assim, “pintada com o cumaru, fruto típico da floresta, em motivos animais, a roupa é considerada de alta honraria e foi dada à [então] senadora há dez anos”, que, aliás, à ocasião do evento, não deixou por menos: “Já que era para homenagear a moda brasileira, nada melhor do que usar as raízes mais profundas do Brasil” – isso sem falar que, para complementar o visual, Marina usou como acessório um colar feito por ela mesma. Sem mais palavras... Porém, tenho de concluir esta postagem. Bom! Que a vida dá voltas, sabemos, mas as de Marina são mistérios... Desígnios da floresta? O fato é que da sobrevida no seringal à vida que hoje tem, Marina foi, de graveto em graveto, ou melhor, de fio em fio, tecendo as suas próprias escolhas: as passadas e as do presente. As futuras? Ela, com certeza, já anda a tecer... No entanto, como toda mulher que se preza, sempre lutou para tentar conciliar a vida pública e a privada. Esposa, mãe de quatro filhos, dois do primeiro casamento e dois do segundo, historiadora, pedagoga, ex-vereadora, ex-deputada estadual, ex-senadora, ex-ministra do Meio Ambiente, ex-candidata à Presidência da República, ambientalista de renome internacional e, possivelmente, em breve, estilista de joias à moda da casa, Marina continua encontrando tempo para não importa qual o desafio que ouse bater a sua porta, no caso, tempo para sonhar: “O meu sonho é ser psicanalista, mas, aí, entra um conflito ético. Só vou trabalhar com isso se, um dia, sair da política”. Quem o saberá? Não obstante, enquanto isso, ela faz o que mais gosta: militar pela causa ambiental, sobretudo pela sustentabilidade do planeta. Infelizmente, como nem tudo é perfeito, a preocupação, hoje, de Marina é a de que, apesar de sabermos “que somos finitos como raça”, não sabemos “como lidar com a imprevisibilidade dos fenômenos climáticos”. E, segundo ela, que sempre pisou com firmeza no chão, apesar dos passos suaves, sentindo a energia que dele emana, um fator que só piora ainda mais a situação é que “temos pouco tempo para aprender como fazê-lo”. E é isso! De seringueira de certo breu do Acre à cidadã global, Marina Silva, atualmente, é uma das mulheres mais galanteadas do mundo, perdendo as contas – tudo indica que beira a uma centena – dos prêmios, títulos, comendas e demais homenagens que já lhes foram prestadas e continuam sendo – não importa por qual junta do planeta –, é, ainda, literalmente, um verdadeiro exemplo de superação das adversidades da vida...

*Postado originalmente no dia 13 de maio de 2012.

Nathalie Bernardo da Câmara

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