quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

2015: SOB A NÉVOA DA HIPOCRISIA E DO OBSCURANTISMO...

Os sonhos são os parâmetros do nosso caráter...”.

Henry Thoreau (1817 - 1862)
Escritor norte-americano


Há quem me considere pessimista – nem isto nem aquilo, parafraseando a poetisa brasileira Cecília Meireles (1901 - 1964), ou seja: nem pessimista nem otimista. Na verdade, eu constato fatos – nada a ver com otimismo ou pessimismo. Só constato fatos. E não apenas porque sou formada em jornalismo, mas porque já o fazia desde a minha tenra idade – é da minha natureza. Uma das cartilhas, por exemplo, na qual nunca “rezei” foi na da dissimulação, na da hipocrisia – coisa que, por me fazer um enorme mal, desencadeando-me, inclusive, crises de esofagite, eu sempre abominei. Daí repudiá-la com todas as minhas forças. Ocorre que, infelizmente, essa dubiedade de comportamento dito humano está historicamente entranhada em não importa qual cultura dos rincões os mais diversos da Terra – planeta esse, coitado, de há muito implorando por arrego. E em todos os sentidos! Porém, essa situação agrava-se porque, desde que o mundo é mundo, parece até que é mais “cômodo” as pessoas optarem pela leviandade, ou pela omissão – coisa que, para quem tem bom senso, traduz-se numa postura para lá de ultrajante, sobretudo quando se constata que a mediocridade e o obscurantismo andam a se disseminar por toda parte, indiscriminadamente, tipo praga de gafanhoto ou de pardal, que, diga-se de passagem, só nidifica em habitações humanas, propagando de um tudo, menos harmonia.

Então... Eis que muitas culturas já estão sob os auspícios de um novo calendário – a euforia praticamente generalizada do réveillon deixou isso bem claro. O problema é que, por mais que, certa vez, a minha estimada amiga Rita Amaral (1958 - 2011), antropóloga brasileira de notório saber, tenha dito que “divertimento é coisa séria e pode até mesmo ser entendido como a segunda finalidade do trabalho, vindo logo após a necessidade de sobrevivência”, eu confesso que nunca me iludi com certas crendices nem com ditas “necessidades” humanas para externar “algo” supostamente reprimido – de uns tempos para cá, então, o meu ceticismo anda cada vez mais arraigado no meu tão sensível coração de poetisa! Não consigo, portanto, melhor dizendo, é humanamente impossível fazer vista grossa diante da hipocrisia, individual ou coletiva, do desprezo e da intolerância em relação as diferenças: sejam elas comportamentais, políticas, raciais, religiosas etc – as desigualdades sociais, então, só num crescente! O pior é que esse tipo de postura tem se tornado mais evidente e ostensiva a cada ano que passa. E nem adianta querer tapar o sol com a peneira, alienar-se, porque estamos diante um fato! Basta observar os conflitos que, no dia a dia, eclodem por toda parte, indiscriminadamente, seja no seu próprio quintal ou alhures. O fosso, por exemplo, entre a cultura ocidental e a oriental, numa vertigem lancinante.


Interrompendo...

Charge do cartunista francês Olivier Sanfilippo


No dia em que a nova edição do jornal satírico francês Charlie Hebdo foi publicada (07/01/2014), um ato terrorista, atribuído a fundamentalistas islâmicos, abalou a redação do semanário, matando 12 pessoas. Segundo o portal O Grito, “quatro dos principais nomes das HQs de humor na França, Wolinski, Cabu, Tignous e Charb foram confirmados entre os mortos no atentado à revista Charlie Hebdo, em Paris. As informações foram confirmadas pela polícia francesa. Segundo informações da AFP e The Guardian, dois homens entraram na redação [durante uma reunião de pauta] e iniciaram um tiroteio com fuzis. A revista já tinha sido alvo de ataques no passado depois de publicar caricaturas do profeta Maomé, o que é proibido segundo a religião muçulmana. Três anos atrás a sede chegou a ser incendiada em retaliação às charges. Wolinski tinha 80 anos e era considerado um mestre da charge. Ele trabalhou em revistas como Libération, Paris-Match, L’Écho des savanes e fundou a famosa revista satírica L’Enragé em 1968. “Wolinski influenciou todo mundo que vocês conhecem: Ziraldo, Jaguar, Nani, Henfil, Fortuna”, disse o cartunista brasileiro André Dahmer. Jean Cabut, outra vítima, era bastante popular na França, com passagens pela TV. Ele foi um dos fundadores da publicação Hara-Kiri, nos anos 1960. Stéphane Charbonnier, conhecido como Charb, era diretor da revista e um dos defensores da liberdade de expressão da publicação após as primeiras polêmicas com as charges de Maomé. Ao lado de Tinous, também morto, fez sua fama dentro das páginas da Charlie Hebdo. 



 Fotos de arquivo mostram cartunistas da equipe da revista 'Charlie Hebdo' mortos no ataque. Da esquerda para a direita: Georges Wolinski (em 2006), Jean Cabut - o Cabu (em 2012), Stephane Charbonnier - o Charb (em 2012) e Tignous (em 2008) (Foto: Bertrand Guay, François Guillot, Guillaume Baptiste/AFP)


Identificados todos os mortos do ataque à ‘Charlie Hebdo’ em Paris

Oito vítimas trabalhavam para a revista e duas eram policiais.
Um funcionário do prédio e um visitante também morreram.


07/01/2015Do G1, em São Paulo

A identificação das vítimas fatais do ataque à revista “Charlie Hebdo” foi encerrada na noite de quarta (7). Os atiradores que invadiram o local mataram 12 pessoas e deixaram 11 feridas, quatro delas em estado grave.

Os primeiros mortos a serem identificados foram quatro renomados cartunistas, Stéphane Charbonnier, conhecido como Charb e também editor da revista, o lendário Wolinski, Jean Cabu e Bernard Verlhac, conhecido como Tignous.

Além deles, outros quatro funcionários da “Charlie Hebdo” morreram: o também cartunista Phillippe Honoré, o vice editor Bernard Maris, um economista que também escrevia colunas para a publicação, o revisor Mustapha Ourad e a psicanalista Elsa Cayat, que escrevia uma coluna quinzenal chamada “Divan”.

Entre as outras vítimas fatais, segundo o jornal "Le Monde", estão o policial Franck Brinsolaro, morto dentro da redação, e o agente Ahmed Merabet, que morreu já na rua, durante a fuga dos atiradores. No ataque também morreram um funcionário da Sodexo que trabalhava no prédio, Frédéric Boisseau, de 42 anos, e um convidado que visitava a redação, Michel Renaud.

Ainda de acordo com o jornal, o jornalista Philippe Lançon é uma das vítimas gravemente feridas. Crítico literário do jornal "Libération", ele escreve crônicas para a "Charlie Hebdo".


E o último cartoon  de Charb...

 Publicada na última edição do Charlie Hebdo, a charge acima se revelou premonitória (“Ainda não houve atentados na França. Esperem. Temos até ao fim de janeiro para os nossos votos de Ano Novo”) – não demorou muito, a brutalidade do gesto covarde, que foi o ato terrorista contra o jornal, consternou a França. E o mundo.


Diante, portanto, do golpe que, covardemente, apunhalou a minha querida França e a liberdade de expressão, as palavras desandaram, desandei... O fato é que os brutos não amam. De qualquer maneira, o ato terrorista ocorrido em Paris apenas confirma o raciocínio original desta postagem. Ou seja, hipocrisia não leva a nada nem a lugar nenhum. Ignorância, intolerância e fanatismo, no caso, religioso, muito menos. Desse modo, os responsáveis por tamanha barbaridade só merecem o desprezo de todos. E a Cidade Luz, apesar de chocada, não irá ofuscar-se, não irá curvar-se diante do obscurantismo, representado ou não por capuzes. 



Nathalie Bernardo da Câmara


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